3 de setembro de 2018

Incêndio no Museu Nacional foi controlado por volta das 3h da manhã; dano é irreparável

Tânia Rêgo/Agência Brasil

O Corpo de Bombeiros informou que a partir das primeiras horas desta manhã homens de 13 quartéis e 24 viaturas estavam no local. Integrantes da Polícia Federal, Polícia Militar e da Guarda Municipal, além de profissionais de saúde, também foram chamados para colaborar com os trabalhos.

Vários diretores, funcionários e pesquisadores do Museu Nacional passaram a noite no local acompanhando os trabalhos e tentando colaborar. Havia preocupação com as dificuldades em controlar as chamas, a ausência de água e o risco de desabamento.

Oficialmente, o Corpo de Bombeiros informou que não há ainda dados sobre as causas do incêndio. Ontem (2), funcionários do museu relataram problemas na obtenção de água, pois dois hidrantes não funcionaram no momento em que os bombeiros estavam no local.

Como o museu está em uma colina, no parque nacional, há uma série de limitações para o fornecimento de água. Os bombeiros confirmaram que o abastecimento de água foi feito por carros-pipa, cedidos pela companhia de água e esgoto do Rio de Janeiro.

Acervo

O Museu Nacional do Rio reunia um acervo de mais de 20 milhões de itens dos mais variados temas, coleções de geologia, paleontologia, botânica, zoologia e arqueologia. No local, estava a maior coleção de múmias egípcias das Américas.

No local, também estava Luzia, o mais antigo fóssil humano encontrado nas Américas, que remete a 12 mil anos, e representa uma jovem de 20 a 24 anos. No museu, havia ainda o esqueleto do Maxakalisaurus topai, maior dinossauro encontrado no Brasil.

O museu é a mais antiga instituição histórica do país, pois foi fundado por dom João VI em 1818. É vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com perfil acadêmico e científico. Tem nota elevada nos institutos de pesquisa por reunir peças raras, como esqueletos de animais pré-históricos e múmias.

História

O local foi sede da primeira Assembleia Constituinte Republicana de 1889 a 1891, antes de ser destinado ao uso do museu, em 1892. O edifício é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

O Museu Nacional do Rio oferece cursos de extensão e pós-graduação em várias áreas de conhecimento. Para esta semana, era esperado um debate sobre a independência do país. No próximo mês, estava previsto o IV Simpósio Brasileiro de Paleontoinvertebrados no local. 


A destruição para além do físico

O incêndio que destruiu o Museu Nacional/UFRJ na noite de domingo, dia 2, levou consigo muito mais do que um prédio histórico que abrigou a família real.

Aliás, desde quando se transformou em Museu Nacional, a instituição fazia questão de se apresentar como um espaço de produção e exposição de ciência.

Quem visitasse esperando um trono real de D. João VI sairia desolado. Poucas referências à presença dos imperiais apareciam em seus corredores. Ainda assim, indiretamente os antigos moradores estavam presentes na exposição.

A cadeira real do antigo imperador do Brasil não estava ali, mas outro trono tinha destaque no acervo. Era do rei Adandozan, do reino de Daomé (atual Benin), na África, e que foi dado em 1811 para Dom João VI como uma prova da boa relação que o reino português – recém fugido para o Brasil – queria manter com este povo.

Uma peça que contribuiu nas relações diplomáticas que consolidaram na trágica história escravista do país.

Muito perto deste trono também havia um manto real. Novamente, não era da família portuguesa. Era um presente, cheio de plumas, do rei Tamehameha II, das ilhas Sandwich (atual Havaí) ao imperador D. Pedro I.

A possível perda destes itens configura um vazio no entendimento de uma relação entre o Brasil e povos estrangeiros que até hoje não é tão exposta ao grande público. Em um museu com uma entrada de R$ 3, ela se tornava mais difundida.

As tão comentadas exposições de Grécia, Roma e Egito também tiveram seu surgimento atrelado às aquisições da família real. D. Pedro, por exemplo, comprava múmias de mercadores para sua coleção particular.

Seu filho, D. Pedro II, chegou a fazer expedições ao Egito para comprar mais. Dentre as adquiridas, existe uma cujo processo de mumificação é bastante raro: cada parte do corpo é enrolada de forma que se possa identificar dedos, braços e pernas.

Somente outras seis no mundo obedecem a esta lógica. Uma peça cuja preservação é de interesse mundial e que atravessou milhares de anos.

Já a imperatriz Teresa Cristina contribuiu com a exposição de Grécia e Roma ao ter expostos os vasos etruscos que tinha comprado. São peças que detalhavam hábitos cotidianos de povos da península de Itálica de uma época anterior ao nascimento de Jesus Cristo. Ao contrário do que muito foi escutado na cobertura do incêndio, o acervo do Museu Nacional transcende os seus 200 anos.

A exposição era muito mais do que as peças adquiridas pela família real. Aquele prédio também era uma instituição de produção de conhecimento. Estavam ali os fósseis de Luzia, a mais antiga moradora de nossas terras e que mudou a percepção sobre o deslocamento da humanidade da África até a América.

É também o museu que fez importantes descobertas paleontológicas e se transformou em um dos principais centros de estudo na América Latina. São dezenas de pesquisadores que perdem completamente suas pesquisas. O prédio, tombado como patrimônio público, poderá ser reerguido. Não será como antes, infelizmente.

Ainda assim, irrecuperáveis serão as peças e pesquisas que, porventura, forem destruídas. Surgirão lacunas na já tão complicada forma como narramos e lidamos com o nosso passado e um atraso cientifico que impedirá a produção de conhecimentos futuros.


Reitor: dificuldades dos bombeiros prejudicaram combate a incêndio

O reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, afirmou na madrugada de hoje (3) que as dificuldades logísticas e estruturais dos bombeiros prejudicaram o combate ao incêndio no Museu Nacional. O incêndio no museu, vinculado à UFRJ, começou por volta das 19h30 de ontem (2) e ainda consumia o prédio à 1h30 de hoje.

Segundo o próprio comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Roberto Robadey, o combate ao incêndio foi prejudicado pela falta de água. Segundo Robadey, os bombeiros chegaram com um caminhão-tanque cheio de água, mas quando o reservatório se esgotou, tentou-se sem sucesso usar água dos hidrantes localizados ao redor do museu.

Como a água não tinha potência suficiente para ser lançada no fogo, os bombeiros tiveram que atrasar por vários minutos o combate às chamas até que novos caminhões e carros-pipa da Cedae chegassem ao local.

Segundo um funcionário da Cedae que estava no local, a água não chega com pressão suficiente aos hidrantes porque o museu se localiza em uma colina.

“Reconhecemos o trabalho valoroso do Corpo de Bombeiros, mas a forma de combate ao incêndio não foi da mesma proporção e escala do incêndio. Percebemos claramente que faltou uma logística e uma capacidade de infraestrutura”, disse Leher.

O reitor também reconheceu que, por ser um prédio centenário, a sede do museu não atendia totalmente às exigências contra incêndio.

“Essa é uma edificação muito antiga que foi concebida em um contexto em que não existia o uso de energia, muito menos o uso intensivo de energia como são as edificação acadêmicas, que têm laboratórios, área administrativa, informática. É um prédio que dispunha de brigada, nós temos um trabalho sistemático com o Corpo de Bombeiros e a Defesa Civil, de trabalhar com a brigada. Extintores estavam em dia. Obviamente, a universidade precisa de uma reforma estrutural e foi isso que buscamos com o BNDES {Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social}”, disse.

Recentemente, a universidade fechou com o BNDES um acordo para viabilizar mudanças estruturais no prédio histórico e a mudança de laboratórios e do setor administrativo para prédios anexos, a fim de minimizar o uso de energia elétrica no prédio, deixando-o apenas destinado a exposições. “A primeira parcela seria de R$ 21 milhões. Grande parte desses recursos estava destinada justamente para um sistema de prevenção de incêndio”, disse.

Restrição orçamentária

Segundo Leher, o museu sofreu com cortes no orçamento porque a UFRJ está sob restrição orçamentária, assim como outras universidades públicas brasileiras. “Num contexto como esse, todas as unidades [da universidade] são afetadas”.

O reitor informou que terá uma reunião hoje (3) com o ministro da Educação, Rossieli Soares, e cobrará do governo federal empenho para reconstruir o prédio e o acervo da instituição, que, segundo o próprio Museu Nacional, tem a maior coleção da América Latina.

“Para o país, é uma perda imensa. Aqui temos a nossa memória. Grande parte do processo de constituição da história moderna do Brasil passa pelo Museu Nacional. Este incêndio sangra o coração do país. A única forma que temos neste momento de trabalhar essa brutal perda é reconstruir. Creio que o Brasil tem que forjar um compromisso com a sociedade política, o governo federal, que tem meios para isso, para que haja orçamento, para que a universidade possa de fato reconstruir essa edificação e recuperar, dentro do que for possível, seu extraordinário acervo”, disse.

Acervo

De acordo com o diretor do Museu Nacional, Alexander Kellner, ainda não é possível avaliar o quanto do acervo foi perdido, mas quando as chamas começaram, os professores e funcionários conseguiram retirar algumas coisas.

“O que aconteceu hoje afeta não apenas o museu ou a UFRJ. Afeta todos vocês. Tendo essa tragédia, nossa ação será avaliar o que realmente foi perdido e tentar recuperar o que puder ser recuperado. Não temos como avaliar com exatidão qual o percentual do material que foi retirada antes das chamas. Saiu um material, as pessoas lutaram, professores vieram de suas casas, todos em prol da instituição Museu Nacional”, disse Kellner.

Pelo menos o acervo de invertebrados foi salvo, diz diretora do museu

Em meio às chamas e aguardando o controle do incêndio, a vice-diretora do Museu Nacional do Rio de Janeiro, Cristina Serejo, afirmou que “nem tudo foi perdido do acervo” do museu. Uma coleção de invertebrados escapou do fogo, pois fica em um prédio anexo, que não foi afetado pelas chamas. O museu tem três andares e prédios anexos, localizados na Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, na zona norte da capital.

Segundo Cristina Serejo, alguns pesquisadores conseguiram sair do prédio com seus acervos pessoais. Outros funcionários tiveram condições de retirar computadores pessoais.

O Museu Nacional do Rio reunia um acervo de mais de 20 milhões de itens de geologia, paleontologia, botânica, zoologia e arqueologia. No local, estava a maior coleção de múmias egípcias das Américas, havia ainda esqueletos de dinossauros e várias peças de arte.

É a mais antiga instituição histórica do país, pois o local foi fundado por dom João VI, em 1818. O museu é vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com perfil acadêmico e científico. Tem nota elevada nos institutos por reunir pesquisas diferenciadas, como esqueletos de animais pré-históricos e livros raros.

Fogo

Marcelo Sayão/EFE

O comandante do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, coronel Roberto Robadey Costa Júnior, disse que pelo menos duas áreas não foram atingidas pelo fogo. Segundo ele, por duas horas, os bombeiros e funcionários do museu retiraram uma parte do acervo.

 “Mas é muito triste dizer que muita coisa se perdeu”, disse o comandante. “Estamos trabalhando para evitar mais perdas, para que o fogo não vá para áreas que ainda estão intactas.

O incêndio começou ontem (2) por volta das 19h30. Homens e viaturas de 21 quartéis trabalharam na operação. Segundo o comandante, às 23h30 eram 80 homens e três escadas magirus na área. As dificuldades eram o abastecimento de água, acesso ao local e a elevada quantidade de material inflamável.

Escrito por: Redação/Agência Brasil